sábado, 19 de maio de 2012

Iguais diferenças

Estamos no ano de 1954.

O que somos nós, a raça humana? Sim, aparentemente somos a espécie mais desenvolvida dentre todas as outras. E por isso a lei dos mais adaptados, que Darwin explicou tão bem, cabe a nós. Se nós somos os mais adaptados, obviamente e, naturalmente, devemos subjugar todas as outras formas de vida. Se isso é certo ou errado, não vou entrar nesse ponto agora (apesar de ter opiniões muito contundentes a respeito disso), mas o que interessa nesse meu devaneio aqui, é a nossa superioridade, não numérica, mas racional. Pois bem, a nossa honorável espécie branca humana é superiora a todas as outras espécies vivas desse planeta. Nós pensamos, nós temos um raciocínio tão avançado a ponto de eu mesmo estar aqui escrevendo isso, para que vocês que estão aí, possam ler. E isso é sim, algo superior.

E graças às pesquisas feitas pelos nossos atuais antropólogos, nós podemos subjugar os nossos inferiores. Segundo Darwin e segundo todos os evolucionistas, nós viemos dos macacos. Pois sim, um dia os macacos se desenvolveram a ponto de descerem de suas confortáveis árvores e resolveram caminhar no chão. Caminharam e se desenvolveram muito, e por muitos milhares de anos, a ponto de chegarem onde estamos agora. E é claro, nem é preciso ser um pesquisador antropólogo para concluir que, após milhares de anos, a sequência de adaptação foi simplesmente a seguinte: macacos nas árvores, macacos andando, humanóides negros, humanóides morenos, homens superiores brancos.

E é por isso que estou aqui escrevendo isso. Porque a adaptação fez de nós, homens brancos, seres superiores a quaisquer outra espécie no mundo. Seja essa espécie uma galinha, um lobo ou um homem negro. E é por esse motivo que eu defendo a separação racial nos ônibus, por exemplo. Eu não quero e nem preciso sentar ao lado de um homem inferior negro. Esses homens e mulheres que sentem, no fundo do ônibus, sorrindo de alegria. Eles que sentem lá, enquanto eu sento aqui na frente, sorrindo também.

Estamos agora no ano de 2011.


Estou aqui sentado ao lado de um grande amigo meu, pretinho como carvão (opa, segundo a patética cartilha do politicamente correto e sob riscos de ser processado, tenho que chamá-lo de outra forma, mesmo que ele não se importe como eu o chamo), ao lado do meu grande amigo afro-descendente, esperando o nosso ponto para descer, que ainda está longe. Enquanto esperamos, entra no ônibus um casal de homens, com a nossa mesma idade. Mas, um casal de homens.

Eu e o meu negro amigo, sequer nos importamos. Afinal, são apenas outras duas pessoas como nós o somos. Mas eles entram e, caminhando de mãos dadas, vão andando e sentam lá, no final do ônibus, sorrindo. Continuo conversando com o meu amigo frivolidades da vida, subterfúgios aleatórios, coisas banais que todo amigo conversa com o outro no dia a dia, até que nós dois escutamos uma voz alta e mais imperativa falando “Que sem vergonhice é essa?”. Era um outro homem, com a mesma idade que a nossa. Esse homem falava isso, enquanto apontava para o casal que acabara de sentar sorrindo lá no fundo do ônibus.

E nesse momento eu tive a óbvia epifania e conclusão que qualquer outra pessoa racional teria tido. Em uma sociedade banal, o que incomoda não é a raça diferente ou orientação sexual diferenciada. O que incomoda é a felicidade alheia.