terça-feira, 9 de outubro de 2012

O último primeiro encontro de um homem

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Nem sei quem sou. Nem sei se serei homem ou não. Sou apenas um espermatozóide nadando num local que eu nunca estive antes, buscando algo que eu nunca vi antes, seguindo simplesmente os meus instintos genéticos. Ou seja, estou nadando em frente e rompendo todas e quaisquer barreiras que eu veja. Mas espere. O que é aquela coisa ali? É algo muito maior do que eu. Na dúvida, pergunto para outro espermatozóide ao meu lado:
- O que é aquilo?
E ele responde:
- Também não sei.
E eu, cada vez mais próximo, pergunto novamente:
- Sério, o que eu faço?
E ele responde:
- Não sei. Vá em frente! Porque eu estou indo!
E eu rapidamente vou. Bato e bato naquela estranha porta, com medo que ela se abra antes para o meu novo amigo ou para os outros estranhos que também estão batendo nela. Mas ela sutilmente se abre para mim. E eu entro. Só eu entro, até ela se fechar novamente.

2
Ok, ainda não sei quem eu sou. Só sei que estou nadando em um local muito quentinho e aconchegante. Estou sendo alimentado e aquecido em um local estranho, por uma pessoa estranha, através de uma estranha sonda acoplada em minha barriga. Mas tenho uma certeza pelo que eu consigo ver, sou um homem. Só não sei o que estou fazendo aqui. Tudo o que sei é que tenho algo que vou chamar de, sei lá, pé. Isso, tenho dois pés. E se eu quiser, posso movimentar esses... pés... com força. Então, vou tentar fazer algum movimento mais forte pra ver se acontece alguma coisa. E na falta de algum nome, vou chamar esse movimento de... chute! Isso. Vou dar um chute com os meus pés e ver o que acontece.

3
Esse lugar quentinho deixou de ser aconchegante. Está apertado. Continua quentinho, mas está muito desconfortável. Eu tenho que sair daqui. Posso? Poxa, não posso nem chutar mais. Esse lugar está apertado. Quero sair. Como posso fazer isso? Será que se eu tentar me esticar, posso sair?

4
Puta merda! Por que eu resolvi sair? Agora estou com frio, assustado e ainda me deram um tapa na bunda. Vou berrar o máximo que puder. Ao invés de me entenderem, estão dizendo que sou bonitinho, lindo e fofinho. Agora estão passando a mão em minha cabeça e, o mais estranho, é que a pessoa que passa a mão na minha cabeça é justamente quem me mantinha naquele lugar quentinho e aconchegante. Estou tentando berrar mais alto ainda, na esperança de voltar praquele lugar. Que saudades sinto.

5
Bom, me acostumei com essa nova moradia. Lugar chato esse. Todo dia, depois de eu andar por aí ela, que agora chamo de “mãe”, me pega e tira toda a minha roupa e me coloca num lugar com uma água quente que me lembra justamente aquele lugar quentinho e aconchegante que eu vivi antes. Pena que dura muito menos. Então ela, a minha mãe, me enxuga e coloca em mim aquela roupa que eu tanto odeio. Quisera eu voltar praquele lugar.

6
Estou num lugar que não entendo. Estou ao lado de muitas pessoas que, como eu, também se arrependem de terem saído daquele lugar quentinho. Lá na frente tem uma moça muito mais velha falando algo sobre “tabuada”. E essa moça pede que todos nós decoremos o que é tabuada de 4 por 7, porque “vai cair na prova”. E já que ela pediu tão gentilmente , eu decorei. Mas uma amiga minha não conseguiu decorar. E eu ajudei ela.

7
Estou nervoso. Mas muito nervoso. Na noite de hoje irei numa festa das pessoas da minha escola e lá estará aquela minha amiga que eu ajudei a decorar a tabuada. E não sei porque estou nervoso. Mas vou na festa.

8
Estou na festa das pessoas da minha sala. E ao meu lado estão todos os meus amigos. Lá longe, do outro lado do salão de festas, está aquela minha amiga que eu ajudei na tabuada. Eu nem deveria me importar com isso, mas não sei porque, estou me importando. Devo ou não ir lá falar com ela?

9
Não fui, ok? Fiquei a festa inteira ali, sentado no meu canto, bebendo coca-cola. Enchi a cara de coca-cola e fui embora. Mas no dia seguinte uma amiga dela falou para mim, nessas palavras “Sabe, ela ficou a noite toda da festa de ontem esperando você ir falar com ela.”. E eu nem acreditei, claro. Tudo o que eu pensei e falei para a amiga dela foi “Sério? Vou falar com ela hoje!”

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E eu fui, ok? Cheguei perto dela e falei “Oi, vamos no cinema hoje?” no que ela respondeu “Ver o quê?” e eu, sem pensar, falei no primeiro filme idiota que eu sabia que estava em cartaz e, por sorte minha, ela disse “Sério? Estou louca para ver esse filme!” e combinamos de ir ao cinema.

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No cinema, o filme idiota começou. E eu nem estava prestando atenção nele, é claro, porque eu queria era a atenção dela. Até que, de repente, o filme me deu de presente uma cena mais assustadora. E ela, deu-me de presente um abraço. Nos olhamos e nos beijamos. E esse filme de terror proporcionou para mim o primeiro peito que eu peguei maliciosamente com as minhas mãos. E foi por baixo da blusa. E claro que nenhum amigo meu jamais soube disso. Aham..................

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“Ei, quer ver algum filme aqui em casa?” foi essa a mensagem que eu recebi, anos depois e enviada por uma conhecida minha, no meu celular. E respondi, inocentemente “Claro! Qual filme?” Depois de algumas horas de silêncio, ignorei a minha própria pergunta e me dirigi, inocentemente, até a casa dela. Ela me convidou para entrar e sim, colocou algum filme no aparelho de DVD. Depois de 5 minutos de filme, começamos a nos beijar de forma mais... intensa. E sim, nesse dia nós dois perdemos nossa pureza.

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“Meu amor, preciso te falar algo.” foi o que eu ouvi da minha namorada quando voltei para casa. “O quê?” perguntei, sem nem pensar. “Eu acho que nós estamos grávidos...” ela disse, com medo que eu pudesse reagir de forma abrupta. “Sério? Isso é ótimo! Digo, temos que planejar muitas coisas de agora para frente, mas é ótimo isso!” eu falei, de forma sincera e cheio de amor. E sim, era sério...

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Ele nem sabe quem é. Não sabe se será homem ou mulher. Aquilo é apenas um espermatozóide nadando num local que nunca esteve antes, buscando algo que nunca viu antes, seguindo simplesmente os seus instintos genéticos. E foi em frente...

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Ali está ela. Eu nem acredito que sou pai, que virei homem, que cresci.

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E aqui está o meu último primeiro encontro, o qual eu faço com muito orgulho. É o momento em que ela, esse pequeno ser feminino, está apertando meu dedo indicador. E dessa pequena princesa eu mal posso esperar que fale apenas uma palavra para me completar: Papai.

4 comentários:

  1. Filmes de terror proporcionando prazeres sexuais momentâneos desde 1896. Curti o texto :D

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  2. Adorei, principalmente a forma simples e ao mesmo tempo intensa que você usou. (:

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  3. "enchi a cara de coca-cola" ahahaha!! Ótimo texto, Rafa! Parabéns xD

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  4. Muito bom, Rafa! Gostei do seu estilo e vou ler os outros :) Você foi super clean, objetivo! Fazer isso com qualidade é difícil, meus parabéns!

    Um abraço do Bartô!

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